Sede do INSS, em Brasília (foto: Divulgação/INSS)
Com um pouco mais de 100 dias do Governo Lula, no INSS nada mudou! As medidas até o momento implementadas são de continuidade do projeto do governo Bolsonaro de destruição do INSS.
No âmbito do Serviço Social, permanecem as/os mesmas/os gestoras/es do governo anterior e as medidas implementadas vem sendo de extinção do Serviço Social na Previdência.
Até o momento, nenhuma proposta que reestruture esse importante serviço previdenciário foi realizada. A medida para resolução dos problemas no INSS foi a publicação, no último dia 6 de abril, da Portaria DIRBEN/INSS nº 1125, que estabelece procedimentos para priorizar agendamentos das ações profissionais do Serviço Social no âmbito do INSS.
A proposta da gestão do INSS, com a participação da Divisão de Serviço Social (DSS), é para a realização de serviços extraordinários e ampliação da quantidade de avaliações sociais diárias realizadas pelas/os assistentes sociais da autarquia. Listamos cinco razões para argumentar que esta medida é uma armadilha. Confira abaixo:
Primeiro, é preciso que o INSS faça uma análise qualitativa dos reais motivos do represamento de BPC; há graves problemas de gestão, além da necessidade de realização de concurso público.
Segundo, não é a avaliação social o motivo de represamento do BPC, logo serviços extraordinários não resolverão o problema.
Terceiro, as avaliações sociais extraordinárias poderão ser realizadas inclusive por assistentes sociais que atuam em outras áreas do INSS, mesmo sem treinamento e capacitação para realização dessa atividade, afetando gravemente a qualidade dessas avaliações, bem como os direitos das pessoas com deficiência.
Quarto, a gestão técnica do Serviço Social parece desconhecer o alto índice de adoecimento das/os assistentes sociais no INSS, muitos com dificuldades de compensar a greve devido as dificuldades impostas ao Serviço Social, limitando a compensação da greve exclusivamente com avaliações sociais, com inúmeros assistentes sociais já realizando acima de cinco avaliações diárias e/ou permanecendo cerca de 10 horas diárias nas agências. Nesse ponto, destaca-se que o INSS não reconhece a jornada de 30 horas para as/os assistentes sociais, estabelecida em Lei.
Além disso, em quinto lugar, essa proposta se configura como uma grande armadilha para o Serviço Social no INSS, que vem nos últimos anos com uma luta incessante, defendendo um limite da quantidade de avaliações diárias, bem como o mínimo de 60 minutos para realização de avaliações sociais, para assim priorizar a qualidade do atendimento às pessoas com deficiência, uma das conquistas da greve de 2022, descumprida com essa medida pela autarquia.
Descumprimento do acordo
É importante que a categoria fique atenta, já que a lógica da autarquia é: vão-se os bônus e ficam-se os ônus. É nítido que o objetivo do INSS com esta medida é criar um subterfúgio para descumprir o acordo de greve, além de ampliar e aprofundar a lógica produtivista no Serviço Social, ações essas rechaçadas tanto pela Comissão Nacional de Assistentes Sociais da FENASPS (CONASF) quanto pelo conjunto CFESS/CRESS.
Além da proposta de realização de serviços extraordinários, a portaria impõe, àquelas/es assistentes sociais que realizam seis horas mais pontuações em complemento à jornada de trabalho, a realização de avaliações sociais para complemento de jornada, além do limite de 5 (cinco) previsto no acordo de greve, ou seja, amplia o limite de avaliações sociais.
Mais uma vez, o INSS descumpre frontalmente o acordo de greve, além de impossibilitar que as/os profissionais realizem as demais atividades previstas no Manual Técnico do Serviço Social e na Matriz Teórico Metodológica do Serviço Social, que também têm previsão no acordo de greve.
A FENASPS desde o início da imposição de “pactos individuais” pelo INSS orientou a categoria sobre os riscos de assinatura de pactos, a gestão sempre altera o que chamam de “regras do jogo”. Com a extinção da jornada de 6 horas para as/os servidoras/es do atendimento, a proposta do INSS vem sendo pactos de produtividade, somando jornada de trabalho mais metas por pontuações.
Além disso, a proposta é de intensificar o trabalho e diminuir o tempo da avaliação social, considerando que, na proposta divulgada, o profissional poderá realizar a 6ª e 7ª avaliação dentro da jornada, ferindo, sem dúvida, a qualidade do atendimento e, mais uma vez, o direito das pessoas com deficiência.
Cabe destacar que nenhuma dessas medidas foi discutidas no Comitê Permanente dos Serviços Previdenciários previsto no acordo de greve, o que já se configura, mais uma vez, no descumprimento do acordo, considerando que o objetivo do comitê é discutir os processos de trabalho dos serviços previdenciários e essas medidas alteram gravemente os processos de trabalho do Serviço Social.
Importância do Serviço Social no INSS
Ainda, a portaria reforça e reduz o Serviço Social à realização de avaliações sociais, sem dúvida uma atividade importante e prioritária, mas não a única realizada pelo Serviço Social na Previdência.
Há diversas outras atividades importantes e fundamentais que as/os assistentes sociais estão sendo impedidos de realizar, retirando qualquer autonomia na organização do trabalho, conforme as demandas locais e previsão ética e técnica.
É importante ressaltar que as atividades de socialização de informações e assessoria e consultoria são imprescindíveis, diante das barreiras enfrentadas pela população de acesso às plataformas digitais. Inclusive, essas atividades, sem dúvida, contribuiriam para resolutividade e diminuição da fila do INSS, alimentada pela própria autarquia que desconsidera aspectos qualitativos vitais para atendimento à população.
A exemplo, podemos citar e demonstrar, com dados concretos, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) para pessoas com deficiência, alvo da proposta desta portaria.
Com medidas gerenciais impostas, como barreiras de acesso ao atendimento da população e a imposição de produtivismo às/aos servidoras/es, a gestão fracassada por meio de programas de gestão que desconsideram a qualidade do trabalho prestado à população e as análises automáticas de benefícios por meio de inteligência Artificial, são algumas das medidas que têm gerado um alto índice de indeferimento e reiterado requerimentos de BPC para as pessoas com deficiência, ampliando a fila e o retrabalho para o próprio instituto, além de demandas de solicitações de recursos e de processos judiciais, onerando os cofres públicos.
Sobre a ampliação de indeferimentos, observemos a Tabela 1.
Tabela 1: Benefícios de Prestação Continuada (BPC) para pessoa com deficiência indeferidos e concedidos de 2015 à 2022.
Ano | Concessões | Indeferimentos | Total | % de indeferimento |
2015 | 137.559 | 211.672 | 349.231 | 60 % |
2016 | 188.160 | 362.419 | 550.579 | 65 % |
2017 | 173.885 | 332.126 | 506.011 | 66 % |
2018 | 165.305 | 323.736 | 489.041 | 66 % |
2019 | 122.000 | 299.664 | 421.664 | 71 % |
2020 | 80.752 | 224.693 | 305.445 | 74 % |
2021 | 180.700 | 486.381 | 667.081 | 73 % |
2022 | 337.216 | 852.209 | 1.189.425 | 72 % |
A tabela acima demonstra a ampliação do já alto índice de indeferimentos do BPC, especialmente a partir de 2016, início da digitalização e alteração no fluxo de atendimento, aprofundado em 2019, período em que ocorre a transformação digital no INSS.
Ao compararmos os anos de 2015 e 2022, podemos observar que houve 12% de aumento de indeferimentos, totalizando o aumento de mais de 102 mil pessoas que tiveram seu benefício indeferido. Para avaliarmos melhor os reais motivos dessa ampliação, analisaremos a Tabela 2, com alguns dos motivos de indeferimento.
Tabela 2: Indeferimentos do Benefício de Prestação Continuada BPC para as pessoas com deficiência de 2015 à 2022, com os motivos: Não cumprimento de exigência, Existência de vínculo em aberto para o titular, falta de inscrição ou atualização no Cadastro Único e Óbito do Titular.
Motivo Indeferimento | Ano indeferimento | |||||||
2015 | 2016 | 2017 | 2018 | 2019 | 2020 | 2021 | 2022 | |
1- Não Cumprimento de Exigências | 7.115 | 11.127 | 18.288 | 16.599 | 4.026 | 994 | 17.807 | 109.280 |
2- Existência de Vinculo em Aberto para o Titular | 2.700 | 1.042 | 1.391 | 1.107 | 575 | 342 | 15.813 | 133.568 |
3- Falta de Inscrição ou Atualização do Cad. Único. | 0 | 0 | 896 | 21.867 | 42.382 | 55.711 | 65.735 | 38.737 |
4- Óbito do Titular | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 300 | 8.458 |
Total | 12.169 | 20.575 | 39.573 | 46.983 | 57.047 | 99.655 | 290.043 | |
% dos motivos de indeferimento 1, 2, 3 e 4 | 3,30% | 6,20% | 12,20% | 15,70% | 25,40% | 20,50% | 34,03% | |
Total de indeferimentos por todos os motivos | 211.672 | 362.419 | 332.126 | 323.736 | 299.664 | 224.693 | 486.381 | 852.209 |
Elencamos quatro motivos de indeferimento que apresentaram substancial aumento no período de 2015 a 2022, sendo eles: 1) Não cumprimento de exigência; 2) existência de vínculo em aberto para o titular; 3) falta de inscrição ou atualização no Cadastro Único e 4) Óbito do Titular.
Sinalizaremos a seguir as possibilidades dos motivos da ampliação desses indeferimentos. Não por coincidência, ocorreram após mudanças nos fluxos e processos de trabalho no INSS.
- Não cumprimento de exigência é quando a/o requerente necessita complementar o requerimento com algum tipo de documento. Foram mais de 109.000 indeferimentos no ano de 2022. Ocorre que muitas dessas pessoas não tem acesso ou não conseguem acompanhar seu requerimento pelo MEU INSS. Em muitas vezes, também tem dificuldades de compreender a documentação solicitada. Antes, quando havia atendimento presencial – e não havia restrição do atendimento exclusivamente por plataformas digitais – a/o requerente já era orientado por um servidor/a a retornar com a documentação correta, minimizando a quantidade de indeferimentos por esse motivo, bem como agilizando o processo de reconhecimento de direito. Cabe ressaltar que o esvaziamento das funções do Serviço Social, no que tange a socializações de informações e atendimento à população, acarretaram também um impacto negativo para as/os requerentes, aumentando os indeferimentos indevidos. Boa parte destes requerimentos sequer tiveram o mérito analisado, indeferidos de pronto mesmo sem a comprovação da ciência do segurado;
- Existência de vínculos em aberto para o Titular: notadamente a ampliação desse indeferimento ocorreu após a implantação da concessão automática do BPC. Em muitas situações são pessoas que têm vínculos em aberto por anos ou até algumas situações que o indeferimento foi indevido (a inteligência artificial tem vários limites na realidade do INSS). Nessa situação, uma simples orientação e/ou procedimento para encerrar o vínculo resolveria até mesmo nas situações de indeferimento devido, a orientação por um/a servidor/a seria a solução dos reiterados requerimento que a/o usuária/o certamente fará. Ou esse requerimento se transformará em recurso ou em ação judicial. Observem o gasto público desnecessário que está sendo gerado pelo INSS;
- Falta de inscrição ou atualização no Cadastro Único: Em 2021, foram mais de 60.000 indeferidos por esse motivo, ora situação muito simples, mais uma vez uma orientação de atualização ou realização do cadastro único impediria esse indeferimento, mais uma vez, retrabalho e gastos públicos indevidos;
- Óbito do titular: Além do próprio INSS alimentar sua fila, é fundamental expor a saga que essas pessoas com deficiência em situação de extrema vulnerabilidade social vivenciam, tendo que realizar diversos requerimentos, recorrer ao Judiciário e no caso de requerimento de recurso são em muitas situações três anos aguardando análise, se configurando uma violência aos direitos das pessoas com deficiência. Assim, o quarto motivo de indeferimento demonstra que além da violência, o projeto do INSS, é um projeto de MORTE, mais de 8.000 pessoas com deficiência faleceram aguardando o reconhecimento do seu direito nas filas do INSS.
Em suma, notem que em 2016 eram 3,3% indeferimentos pelos motivos elencados, em 2022 esse percentual ampliou para 34%. Nesse sentido, as informações acima demonstram os reais problemas do INSS, a necessidade de fazer uma análise e propor ações que de fato reestruturem o INSS e o Serviço Social na Previdência.
Não é proposta de serviço extraordinário e produtividade que resolverá os problemas estruturais da autarquia, são esses que vão ampliar tais problemas, realimentando cada vez mais a própria fila do INSS, de recursos e do Judiciário. Reiteramos, não é a avaliação social o problema de represamento do BPC, a gestão demonstra, mais uma vez, sua incompetência com essa portaria.
Cabe destacar ainda que a gestão técnica do Serviço Social demonstrando sua incapacidade de propor alterações que reestruturem o Serviço Social e ainda impedem as/os assistentes sociais de realizarem suas atividades técnicas.
A socialização de Informações assistenciais e previdenciárias (individual/coletiva – interna e externa) e a Assessoria e Consultoria à rede socioassistencial sem dúvida contribuiriam para minimizar a restrição de direitos dos dados expostos acima, não só no caso do BPC, mas na totalidade dos direitos previdenciários.
Realizar diagnósticos da realidade e das demandas de cada agência e, a partir disso, construir planejamento, planos de trabalho e projetos, retomando todas as atividades técnicas importantes e fundamentais para a população certamente seria um dos caminhos para reestruturar o Serviço Social e contribuir com a própria visão da sociedade sobre o INSS.
Diante disso, a FENASPS publica essa nota, denunciando à toda a sociedade, mais uma vez, o caos estrutural da autarquia, aprofundamento o projeto de destruição da maior autarquia pública da América Latina, o INSS, e a extinção do Serviço Social na Previdência, permanecendo a mesma lógica do governo Bolsonaro, mesmo após 100 dias do governo Lula.
Ressaltamos a necessidade da revogação imediata da Portaria DIRBEN/INSS nº 1125, que na prática é apenas mais uma ideia mirabolante, sem análise aprofundada da realidade concreta do Instituto. Além da referida portaria ter efeitos inócuos quanto à análise dos requerimentos represados, ela representa mais ataque contra o Serviço Social na Previdência e descumprimento do acordo de greve firmado com as entidades sindicais.
Orientamos à categoria para não aderir a pactos de precarização do seu próprio trabalho com as medidas contidas nesta portaria!
Informamos que no próximo dia 24 de abril, após reiteradas solicitações da FENASPS, ocorrerá a reunião do Comitê Permanente dos Serviços Previdenciários e uma das pautas será essa portaria.
FENASPS em defesa da Previdência Social pública e de qualidade e do Serviço Social no INSS!
Fonte: FENASPS.